domingo, 27 de fevereiro de 2011

SÍRIOS-LIBANESES

Campos dos Goytacazes desde tempos bem distantes atraiu para estas terras, tanto agrícola quanto comercial, muitos estrangeiros que já no CENSO de 1848 mostrava entre nós em torno de 665 pessoas de diversos países, levando em consideração também os consulados e vice-consulados. Dentre estes países estão os Sírios-Libaneses que aqui se estabeleceram e permanecem até os dias de hoje. Os primeiros que chegaram à Campos dos Goytacazes em 1880, foram: Téres Coury, Nagib Coury (de Beirute), Salina e Amin Coury (naturais de Douar, em Marrakech), Salim Salomão e Salim Elhaj (de Zahlé). Depois destes seis pequenos negociantes que se estabeleceram na Rua D. Pedro II (Beira Rio), chegou também, no mesmo ano Elias Gabriel Beirute (de Trípoli). Salim Elhaj sendo muito versado na língua francesa serviu de intérprete aos seus compatriotas ainda não acostumados com o idioma local. O jornal “A Gazeta de Notícias”, do Rio de Janeiro, edição de 30 de julho de 1889, publicou a notícia de ter chegado a bordo do vapor “Bearn” sem passaportes, passageiros naturais do Líbano cristãos e católicos, alguns dos quais já tinham no Brasil as suas famílias. Um dos passageiros fora incumbido por um seu irmão, agricultor em Campos dos Goytacazes, de trazer-lhe patrícios para a lavoura, cuja incumbência então desempenhava. O primeiro Sírio falecido em Campos foi Abrahão João, no dia 12 de fevereiro de 1890 e que não teve assistência médica. Nesta época a Câmara cobrava aos sírios que mascateavam, a licença de 10$000 (dez mil réis) por baú. Félix Antonio e Lichad Joseph eram dois desses ambulantes. Em 1890 chegaram a Campos: Jorge Bomenhem, Chequer Nacif e Jorge Nacif, que já encontraram aqui os compatriotas José e Mussi Daher, José Bechara Elquik, Miguel Gazal, Hanna Abdala, sendo todos esses seus conterrâneos, o que foi motivo de intensos festejos entre eles, encontrarem-se em terras tão distantes, mas tão hospitaleira e carinhosa para com todos. Nesta época, já se encontravam em Campos dos Goytacazes: Chequer Haddad, Antonio Cheibub, Jacob Bukhadra, João Baroudo, João Tourqui, Gabriel Minassa e seu irmão Antonio (todos de Trípoli), e Mitre Henaiquete (de Beirute). Alguns destes eram comerciantes e outros mascates, (vendedores ambulantes de quinquilharias), José Assad, espírito autêntico de persistência, fazia à pé suas viagens periódicas para o Rio de Janeiro, comprando e vendendo mercadorias pelo caminho. Ainda em 1890, chegou à Campos dos Goytacazes, em 15 de março, Miguel Calil Chacar (natural de Maasser El Chouf), vindo em sua companhia seus compatriotas Abdala Daud Acrouch, Ibrahim Haddad, Pedro Caram e Namitala Buchaul. Em 1892 foi registrada a chegada de José Jorge Pedro, Antonio Chacar, Macoul Daúd Chacar, primos de Miguel Chacar. Em 1893 chegaram: Nassrala e Rescala Haddad e José Bitar (de Beit Mery), indo logo depois Nassrala e seu irmão para o Rio de Janeiro, onde se estabeleceram e tornaram-se grandes comerciantes. José Bitar foi para Dores de Macabu (12º Distrito), onde virou negociante e agricultor. Em 1894 chegaram no dia 24 de abril, José Jorge Mussi, Miguel Dahea, Pedro Salum e Bechara Abussad (todos naturais de Maasser El Chouf), já encontrando aqui os compatriotas Abdo Saiah e Mitre Jorge (sendo este o que primeiro abriu um comércio de restaurante sírio) e Salim Saleha. Nesta época muitos deles começaram a ter um grande desenvolvimento comercial, agrícola e social, por ter alguns se casado com senhoras campistas, o que veio mais e mais apertar os laços de amizade entre os imigrantes e os campistas. O primeiro casamento de campista com sírio foi no dia 14 de janeiro de 1893, tendo surgido fatos deploráveis provocados por desordeiros, entre eles José Ennes que, incentivado por Joaquim Benedito Costa (certamente por motivo de ciúmes), arrombaram as portas e depredaram o estabelecimento comercial do sírio. Este fato foi muito censurado pela imprensa e pela população. De 1905 até março de 1906, residiu em Campos dos Goytacazes o sacerdote sírio Luiz Tyah, do rito maronita, muito estimado dos seus compatriotas e dos católicos campistas. Um elogio publicado no Jornal “Monitor Campista” que dizia o seguinte: “O árabe logo que se acha estabelecido, procura uma patrícia e constitui família. Respeitador das suas leis é raro vê-lo cometer atos ilícitos. Sóbrio em extremo é bem raro ver um árabe embriagado. Trazem consigo as tradições do seu País, sendo que, na casa do árabe a hospitalidade é peculiar. A mulher árabe tem uma beleza pouco comum, sendo sempre uma boa mãe de família e, aqui entre nós não consta que uma só se tenha desviado do caminho da mais pura honestidade”. Os sírios têm sempre se mostrado excelentes amigos da terra que o acolheu. Hoje, que eles já se estabeleceram por aqui por mais de meio século, estão sempre predispostos ao trabalho honesto, vivendo alegres, entrelaçados com a família campista, nos dando seus filhos, brasileiros legítimos, gozando de nossa estima e consideração. Aqui tivemos grandes agremiações fundadas por este povo que escolheu nossa terra para ser o seu lar: “Centro Syrio-Libanez”, fundado em 31 de outubro de 1930, e o “Campos Phenico Club”, tendo antes, em 1906 a “Sociedade Syrio Beneficente”, cujos diretores foram Miguel Chacar e Chefue Haddad. Alguns destes imigrantes que aportaram em nossa terra tornaram-se tão importantes que hoje desfrutam de uma honraria que é ter seu nome dado a uma Rua. Em breve estaremos citando estes personagens, que atravessaram o mar e aportaram aqui em Campos dos Goytacazes, escrevendo muitas páginas para a história deixada para seus descendentes e marcando a sua presença neste chão.

MARRAKECH

SÍRIA

BEIRUT

Texto e Pesquisa: Hélvio Gomes Cordeiro.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

MIGUEL CATAIA

O Correio estava funcionando desde 1798, quando saíram daqui para o Rio de Janeiro os dois primeiros estafetas a cavalo, pai e filho de sobrenome Cataia. Em 28 de março de 1879 caía do cavalo e fraturava uma perna Miguel Fernandes Cataia, com 100 anos de idade. É o que nos conta Julio Feydit, com o detalhe notável de que, Miguel, com seu pai, foram os dois primeiros estafetas em 1797 e que, portanto, faziam 81 anos e três meses que eles fizeram aquela primeira viagem. Era uma figura muito popular e querida o velho Cataia, com seus longos cabelos e seu bom humor, sua espetacular saúde. Quando da instalação dos Correios eles ganhavam 640 réis de diária, ida e volta, viajando de 15 em 15 dias, sempre às quartas-feiras. Mas essa diária só quando estavam viajando. Em 1840 passaram a ganhar 1$000 (hum mil réis) quando não viajavam e 1$600 (hum mil e seiscentos réis) quando em serviço. Logo depois da ligação Campos-Rio, foi estabelecido mesmo serviço para o Espírito Santo. Pode-se imaginar o alvoroço que envolvia a população excitada com a chegada dos Cataia, que vinham trazendo cartas do Rio de Janeiro. Quem pagava o “selo” era quem recebia a correspondência. E se pode avaliar a popularidade do velho Cataia, cuja morte em 1879 comoveu toda a população, que chorava no seu enterro de primeira classe, o mais luxuoso que a Santa Casa tinha reservado para os barões dos canaviais e senhores de engenho. Mas esses fatos são ignorados, porque o nosso povo conhece mais a História dos Estados Unidos, pela força comunicadora do cinema, do que a nossa própria História. Sabe que o famoso Buffallo Bill começou como estafeta de Correios (o “poney expresso”) atravessando a cavalo regiões dominadas pelos índios, mas a epopéia dos Cataia e outros por este Brasil lhe é desconhecida. Sabe tudo da vida dos chefes índios “Sitting Bull” (Touro Sentado), Cochise, Jerônimo e outros, e não sabe nada do grande chefe índio Araribóia, que saiu de Cabo Frio chefiando os seus temiminós numa frota de pirogas para ajudar na luta pela expulsão dos franceses. E quando o vice-rei lhe foi conceder uma comenda, chegando à igreja, depois de atravessar de canoa a Baía de Guanabara, soube que tinha de ajoelhar-se para receber a láurea, deu as costas, pegou novamente sua canoa e voltou para a sua Praia Grande (Niterói), aos altos brados gritando que um chefe como ele não se ajoelhava aos pés de homem nenhum. Mas as engenhocas se multiplicavam e a cana ampliava conquistas de territórios. Afora os quatro grandes latifúndios – a Fazenda do Colégio e as outras de Joaquim Vicente dos Reis – o Mosteiro de São Bento; o dos Asseca (Fazenda do Visconde); e a do sul da Lagoa Feia (Fazenda do Morgado), o que predomina é a pequena propriedade, ao contrário de Pernambuco. A luta é individual e rude. Cada um cuida de si, de produzir o que pode, cada vez mais caixas de açúcar. Mais ao fim da “safra” ele está de mãos quase vazias, porque tinha que vender toda ela aos negociantes da vila e em virtude da falta de transportes e ainda pelo seu feitio excessivamente particularista, tinha que se submeter aos traficantes. E ainda tinha o inimigo maior a enfrentar. Mais forte do que a onça, as cobras e outros animais, era a malária, o paludismo. Produto do Brejo, eram os dois que esse “peão” pobre, com sua família e seus escravos, tinha que enfrentar. A luta cruenta tornava-os maus para com os escravos, cuja população no início do século era igual à dos brancos livres. Mesmo assim eles incomodavam, e os latifundiários, os senhores de engenho do Rio de Janeiro protestavam contra “esses míseros e apoucados lavradores, supostos possuidores de fracas e tributárias engenhocas”. É Antonio Muniz de Souza quem fala. Ele foi um dos mais lúcidos viajantes-escritores que visitaram Campos dos Goytacazes no começo do século. E a luta contra a malária e as febres podres continua. – “A luta é individual e áspera” – diz Ribeiro Lamego. A produção é subdividida em pequenas porções, mas que somadas já vai alta. Ainda em 1783, as 128.580 arrobas divididas pelo número de engenhocas da época dão média de menos de 500 arrobas por engenho, é ainda Lamego quem informa. – “O fim principal é moer cana e fazer açúcar” – diz Couto Reis. Na primeira década do século XIX já chegam a mais de 600 os engenhos primitivos. Voltemos à Vila de São Salvador. Era iluminada a lampiões de azeite de peixe, de má qualidade. O sino da Cadeia (mais tarde o da Matriz) dava o toque de recolher às 10 horas da noite. Só havia uma rua calçada precariamente, a dos Mercadores (depois Rua Direita e hoje Rua 13 de Maio). Em 1805 ocorreu o crime da Rua das Cabeças (Rua Aquidaban) que Gastão Machado conta com detalhes em “Os Crimes Célebres de Campos”. Em 1808 a vila recebeu com grandes festas a notícia da chegada de D. João VI e sua Corte ao Brasil. Antes, em 1805, era inaugurada a “Casa da Ópera”, teatrinho que existiu na “Rua Detrás da Matriz” (Rua Vigário João Carlos). Em 1811, o Visconde de Araruama foi designado por D. João VI para proceder à limpeza dos rios da Lagoa Feia. Em 1812, a viúva de Braz Carneiro Leão, Ana Francisca, proprietária da Fazenda “Barra Seca”, recebia a mercê do título de Baronesa de São Salvador dos Campos Goytacazes. Em 1827 estabelece-se o primeiro engenho a vapor. Era o começo da “Era da Machina”. E a vila de São Salvador continuava em sua vidinha pacata, limitada a leste pela Rua do Ouvidor, que já era “subúrbio”. Depois da Rua dos Mercadores (13 de Maio), haviam calçado, a pedras irregulares – “pés-de-moleque” – os becos do Dionísio; (Rua Rotary), beco Francisco Manoel Duarte (Travessa Carlos Gomes); e do Campello (Rua 21 de Abril), trecho da Praça Principal à Rua da Alagoa (Rua da Quitanda, atual Governador Teotônio Ferreira de Araújo). Até o toque da Ave-Maria ou pouco depois, ainda havia movimento, conversas e jogo de gamão na Botica de Francisco Rodrigues da Cruz (Chico da Botica, a única existente na vila), localizada na Rua dos Mercadores. Depois do toque de recolher, às 10 horas da noite, já não se via mais quase ninguém, a não ser vultos embuçados em busca de leitos clandestinos. Os escravos que eram apanhados na rua pela ronda depois do toque de recolher eram surrados no dia seguinte no Pelourinho, depois de uma noite de Cadeia.
(Texto extraído do Livro “Na Taba dos Goytacazes”, de Hervé Salgado Rodrigues)

Embora esta edição seja de 1988, estamos mostrando um texto atualíssimo, no qual o autor cobra o reconhecimento de personalidades que fizeram a grandeza de nossa história e nunca são lembrados pelos campistas, ficando relegados somente às publicações em que passem despercebidos. Nós do Instituto Historiar estamos tentando resgatar a história destes nossos vultos que tanto fizeram por nossa Campos dos Goytacazes e, estaremos publicando um histórico sobre cada um deles.


Livro Na Taba dos Goytacazes.
Texto: Hélvio Gomes Cordeiro.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

FÁBRICA DE TECIDOS DA LAPA

Inaugurada em 12 de março de 1885, pelo progressista industrial Francisco Saturnino Braga, no pitoresco bairro da Lapa, a Companhia de Fiação e Tecelagem Campista, mais conhecida como A Campista, deu sustento a várias famílias, por várias gerações. Mantinha três turnos de trabalho, com verdadeiras multidões de operários, composta por homens e mulheres, além de crianças. Toda essa gente dava intenso movimento ao transpor os grandes portões, após marcarem o ponto logo após à entrada da fábrica.
Seguiam, então, com suas marmitas, em direção às respectivas seções, onde, sobre o grande ruído dos teares e a vigilância dos mestres, cumpriam o labor diário.
Por várias décadas A Campista empregou milhares de pessoas, livrando da ociosidade dezenas de menores que, com a oportunidade do trabalho abandonavam a malandragem das ruas. A adversidade, porém, rondava aquela colméia de trabalho, até que levou-a à paralisação em fins de 1956. Com algum sacrifício, voltou a ser ativada tempos depois, passando a ser dirigida por uma junta administrativa liderada por Delcides Ribeiro, passando a tecer, apenas, algodãozinho e a confeccionar sacos para as usinas de açúcar. Utilizava-se de reduzir o número de trabalhadores, pois não havia atividades para todos. A maioria, desiludida, ou procurou outros empregos ou passou necessidades por falta de qualquer tipo de labor remunerado.
Passando por grandes dificuldades financeiras, sem recursos para aquisição de matéria prima e com os salários atrasados dos funcionários, conseguiu sua direção um empréstimo do Banco do Estado do Rio de Janeiro, em abril de 1958, saldando débitos em atrasos de dois meses. O proletariado ciente da crise por que passava a fábrica abriu mão de um dos salários a receber, a fim de que fosse comprado algodão que garantisse a continuidade das atividades. Mesmo assim a Fábrica de Tecidos prosseguiu em condições precárias vindo a encerrar suas atividades em, definitivo, após 1964.
Por vários anos seus grandes portões de ferro permaneceram fechados, oferecendo triste quadro aos olhos dos que por ali passavam. Seus grandes galpões permaneciam de pé, semelhantes a gigantes adormecidos. Davam a impressão de que algum dia, despertariam daquele sono letárgico e tudo voltaria ao antigo movimento. Tudo ilusão! Nunca mais se ouviu o prolongado som do seu apito, chamando os operários para mais uma etapa de trabalho ou avisando-os da hora do retorno aos lares.
Em 1985 – ano em que a Fábrica de Tecidos completaria um século, as antigas edificações começaram a ser demolidas para dar lugar ao moderno colégio denominado Brizolão, apelido do CIEP, ou Centro Integrado de Educação Popular. O nome popular era resultado de ter sido a construção iniciativa do Governador Leonel de Moura Brizola. Logo ao lado, na mesma área da antiga fábrica, foi construída uma agência do BANERJ (Banco do Estado do Rio de Janeiro), atualmente encontra-se ali o Banco Itaú. Contudo, a velha torre da Companhia e Tecelagem Campista foi preservada, passando a figurar como um monumento histórico da economia regional, a lembrar que dalí saia fumaça da matéria prima transformada pelas caldeiras e que resultavam em belos tecidos.








Texto: Alceir Maia Mendonça
Pesquisa e Postagem: Leandro Lima Cordeiro
Imagens: Acervo do Instituto Historiar.